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Introdução
Conhecida a posição da Comissão de Agricultura do Parlamento Europeu em relação às propostas da CE para a reforma da PAC pós-2020, é de extrema importância apresentar um ponto de situação desta problemática.
Na nossa opinião, os aspetos mais relevantes das propostas em discussão são os seguintes:
- um orçamento agrícola mais restritivo, mas mais flexível;
- um novo modelo de organização e gestão da PAC mais descentralizado, com uma maior subsidiariedade e mais orientado para os resultados;
- um sistema de pagamentos diretos aos produtores do 1º Pilar mais equitativo e mais direcionado para o ambiente e alterações climáticas;
- uma nova arquitetura verde mais consistente..
Orçamento agrícola
De acordo com as propostas da CE, o orçamento agrícola da UE para o período 2021-27, ainda sujeito a aprovação, é mais restritivo do que o que está atualmente em vigor. Esta realidade surge em consequência quer do BREXIT, quer das novas prioridades da UE em relação à segurança e à defesa.
A preços correntes, a CE propõe uma redução, entre os períodos 2014-20 e 2020-27, de 5,2% para o montante total de fundos a afetar na UE-27 às medidas do 1º e do 2º Pilares da PAC, redução esta que se estima vir a ser da ordem dos 4,8% no caso do orçamento agrícola de Portugal.
No que diz respeito às verbas correspondentes aos pagamentos diretos aos produtores (PDP) do 1º Pilar, esta variação seria da ordem dos -1,1% para a EU-27 e, em consequência do processo de convergência externa proposto, de +4,8% para Portugal.
No que se refere às verbas correspondentes às medidas do desenvolvimento rural (DR) do 2º Pilar, a variação prevista é -17,1% para a UE-27 e de -14,9% para Portugal.
A restrição orçamental prevista para o desenvolvimento rural no período 2021-27 vai ter em Portugal um impacto mais negativo do que, em média, na UE-27, uma vez que as verbas do 2º Pilar no total do orçamento agrícola são, respetivamente, de 50 e 25%.
Esta redução nas verbas do desenvolvimento rural poderá ser neutralizada se a taxa de cofinanciamento passar de 85 para 70%, o que, no entanto, irá significar um maior esforço do que o atual por parte do orçamento nacional.
Uma outra forma de se poder reduzir o impacto negativo do orçamento agrícola nas medidas de desenvolvimento rural, será a de se aproveitar a possibilidade, proposta pela CE, de se proceder a uma transferência de fundos do 1º para o º Pilar, a qual poderá ir até aos 15%, enquanto que o inverso só será aceite para valores até 5%.
Novo modelo de organização e gestão da PAC
De acordo com as propostas da CE, a aplicação da PAC pós-2020, irá basear-se num novo modelo de organização e gestão da PAC, com o qual se pretende alcançar uma maior subsidiariedade, simplificação e orientação para os resultados, baseado:
- numa fixação pela UE dos principais parâmetros base da política (os objetivos gerais e específicos);
- num estabelecimento por cada EM de um Plano Estratégico da PAC (PEPAC);
- numa aprovação, monitorização e avaliação do desempenho, pela CE, dos Planos Estratégicos nacionais.
No estabelecimento do PEPAC, cada EM vai ter que:
- respeitar os objetivos gerais e específicos fixados pela UE;
- integrar as medidas de política do 1º e do 2º Pilar, o que os torna mais abrangentes do que os atuais PDR, mas de uma forma menos complexa;
- escolher as intervenções (PDP, DR e intervenções sectoriais) que sejam consideradas mais adequadas para o cumprimento dos objetivos fixados;
- integrar o quadro de cumprimentos e de controlo aplicáveis aos beneficiários.
Trata-se, portanto, de uma forma mais descentralizada de conceber e implementar a PAC, da qual se pretende que venha a resultar uma maior margem de manobra nacional na escolha das medidas de política mais capazes de contribuir para um desenvolvimento sustentável do sector agroalimentar e das zonas rurais de cada EM.
Um sistema de pagamentos diretos aos produtores mais equitativo e mais orientado para o ambiente e o combate às alterações climáticas
Do ponto de vista da arquitetura dos PDP do 1º Pilar proposta pela CE, para o período 2021-27, a única diferença existente em relação à situação atual diz respeito à eliminação do Pagamento Verde (ou “greening”) e a sua substituição pelos Eco regimes, uma vez que, com designações por vezes diferentes, se mantêm os outros tipos de pagamentos em vigor:
- Pagamento base ao rendimento;
- Pagamento complementar redistributivo;
- Pagamento complementar aos jovens agricultores;
- Pagamento (ou apoio) ligado (ou associado) à produção;
- Pagamento aos pequenos agricultores.
Apesar da composição futura do sistema de PDP do 1º Pilar ser muito semelhante à em vigor, ela vai estar sujeita a um conjunto de condições que implicarão uma maior equidade, em consequência:
- da aplicação de um processo de convergência interna do respetivo Pagamento Base (PB), que implica que os respetivos valores convirjam para 75% da média nacional em 2024 e para 100% da média nacional em 2027;
- da obrigatoriedade da aplicação por cada EM do pagamento redistributivo (PR), para um montante mínimo de 5% do total das verbas afetas aos PDP;
- da obrigatoriedade de uma redução dos PDP por beneficiário para valores anuais superiores a 100 mil euros (“capping”), que poderá vir a ser dispensada se o EM optar por afectar ao pagamento redistributivo 10% do montante total de fundos associados com os PDP do 1º Pilar.
No que diz respeito ao processo de convergência interna do PB, a proposta inicial da CE referia-se apenas a uma aproximação a 75% da média nacional, sendo da responsabilidade da Comissão de Agricultura do Parlamento Europeu a aprovação de uma convergência total em 2027.
Em relação ao Pagamento Redistributivo, as diferenças face à situação em vigor dizem respeito, por um lado, ao seu caracter obrigatório e, por outro lado, à possibilidade de poder vir a substituir o “capping” se o seu valor total atingir 10% dos PDP.
No que se refere à redução dos PDP por beneficiário, não se mantem a progressividade proposta pela CE para valores entre os 60 e os 100 mil euros. Por outro lado, a Comissão de Agricultura do Parlamento Europeu propõe que, no cálculo do valor do “capping” (100 mil €), se aplique um desconto de 50% no valor dos salários efectivamente pagos ou atribuídos e não um desconto do seu valor total como consta da proposta inicial da CE.
O novo tipo de PDP do 1º Pilar, designado por Eco regime, é de aplicação obrigatória por cada EM, mas facultativo para os respetivos agricultores. Trata-se de um pagamento a atribuir a práticas agrícolas consideradas benéficas do ponto de vista do ambiente e do clima. Cada EM vai ter que definir uma lista de práticas agrícolas suscetíveis de contribuir para três dos objetivos específicos da PAC, relacionados com o clima e o ambiente e que deverão constituir compromissos que vão para além das condicionalidades e de outros requisitos básicos. Por último, importa sublinhar que os Eco regimes poderão vir a ser atribuídos sob a forma de pagamentos adicionais de apoio base para hectares ativados com direitos, ou como forma de compensação de custos acrescidos ou de perdas de rendimento decorrentes da adoção das práticas agrícolas em causa.
Uma nova arquitetura verde
A arquitetura verde da PAC, atualmente em vigor, integra:
- as medidas agroambientais (MAA) do 2º Pilar, de aplicação voluntária por parte dos agricultores;
- o “greening” do 1º Pilar, de aplicação obrigatória por parte dos agricultores;
- as condicionalidades, que também são de aplicação obrigatória.
As propostas da CE para a PAC pós-2020 estão orientadas para uma nova arquitetura verde baseada:
- em medidas do tipo agroambiental, designadas por Regimes clima/ambiente integradas no 2º Pilar e de aplicação voluntária por parte dos agricultores;
- nos chamados Eco regimes do 1º Pilar, também eles de aplicação voluntária por parte dos agricultores;
- em condicionalidades reforçadas de aplicação obrigatória.
Os chamados Regimes clima/ambiente são de aplicação obrigatória por cada EM e integram diferentes tipos de medidas agroambientais e agroclimáticos, a agricultura biológica e as medidas silvo-ambientais.
Trata-se de pagamentos anuais, com períodos de compromisso plurianual de 5 a 7 anos, ou mais, se tal for justificado, calculados com base nos custos acrescidos ou nas perdas de rendimento por práticas que vão para além das condicionalidades e de outros requisitos básicos.
De acordo com as propostas em discussão, este tipo de regimes deverá, conjuntamente com as medidas às zonas desfavorecidas (MZD), beneficiar de um mínimo de 30% do orçamento do 2º Pilar.
No que diz respeito aos Eco regimes do 1º Pilar, cujas principais características foram anteriormente apresentadas, importa ainda sublinhar que as propostas em discussão apontam para que estes venham a beneficiar de um mínimo de 20% do orçamento disponível para os PDP do 1º Pilar.
No que diz respeito às condicionalidades a que irão estar sujeitos todos os beneficiários de PDP, são reforçadas face às atuais, uma vez que, não só integram o conjunto de compromissos, atualmente em vigor, no âmbito do “greening”, mas também outras obrigações relacionadas com a gestão de nutrientes e a proibição de conversão de pastagens permanentes em terra arável em toda a Rede Natura 2000.
Francisco Avillez – COORDENADOR CIENTÍFICO DA AGROGES