Desde muito cedo na sua história que a AGRO.GES desenvolve trabalhos diversos fora de Portugal, sendo a maioria dessa actividade com foco na Africa lusófona. Desde um primeiro trabalho, sobre segurança alimentar em Moçambique, para a União Europeia, em 1996, que o bichinho ficou, e foram múltiplas as situações em que os nossos colaboradores participaram em estudos e projectos com grandes impactos e muitas histórias.
Em 2015, a AGRO.GES foi contratada por uma multinacional Sul Africana para fazer uma análise crítica a um plano de negócios para uma fábrica de concentrado de tomate a construir no regadio do Chókwe, em Moçambique.
O documento assentava já num conjunto de ações de trabalho prévias, incluindo um ensaio de variedades que tinha já identificado as mais adequadas à região. No entanto, e uma vez que o plano não previa produção própria de tomate, desde logo nos pareceu que os investidores deveriam fazer um novo ensaio, para testar não a capacidade produtiva das variedades, mas o comportamento dos agricultores. Esse estudo seria algo isolado do nosso trabalho, e, pensávamos nós, feito pela mesma equipa de campo que tinha feito o primeiro ensaio. Quando o nosso projecto se iniciou, foi essa a recomendação que fizemos.
Para nossa surpresa, o cliente pediu-nos para fazermos esse ensaio também. Era abril, o que significa que teríamos cerca de um mês e meio para organizar tudo e ter plantas na terra, para que a colheita não fosse prejudicada pelas chuvas. E assim iniciamos um contra-relógio que para sempre ficará como um marco do nosso departamento internacional. Aceitámos o desafio!
Em pouco tempo estávamos em Moçambique, para identificar os pontos-chave de que iríamos necessitar: equipamento de rega, viveiro, a técnica responsável e o técnico local de assistência técnica aos agricultores, e entrevistar agricultores para o projecto. Esses primeiros tempos foram de grande alvoroço! Mas com a grande sorte de termos incluído na equipa uma agrónoma que trabalhava com um parceiro da AGRO.GES em Maputo, que foi a nossa técnica responsável e conhecia bem a região, conseguimos organizar os trabalhos.
Dessa primeira deslocação resultou que o projecto parecia ser exequível, mas havia muito a fazer. Nessa altura já tínhamos identificado um técnico local para acompanhar os agricultores, que, nesta simulação, fazia o trabalho da equipa de assistência técnica que o projecto previa instalar, já tínhamos identificado cinco agricultores para participar no ensaio, e já tínhamos identificado o viveiro para fazer as plantas. E o tempo que se seguiu, até à plantação, foi uma corrida!
Em pouco tempo instalámos a rega no campo, através do desenho de soluções engenhosas para instalar campos de ensaio com dois hectares, onde se regava metade por gravidade (método tradicional que os agricultores já conheciam) e outra metade por gota-a-gota (uma inovação).
Também em pouco tempo, cinco variedades foram identificadas para o ensaio e enviadas ao viveiro para produção. Cada campo, de cada agricultor testaria as cinco variedades sob ambos os sistemas de rega.
E o tomate foi crescendo, geralmente com grande interesse dos agricultores, e a presença do Salimo, jovem técnico agrícola da Instituto Agrário de Chókwe, que se deslocava numa mota que o projecto comprou localmente.
Com muitas peripécias à mistura, ficamos a conhecer melhor o comportamento dos agricultores e as condições existentes para o funcionamento de uma operação de produção de tomate em escala, numa zona que tem alguns problemas, mas com bastante potencial.
O perímetro do Chókwe rega a partir da barragem de Macarretane, no Rio Limpopo, uma área que, na sua projeção era de 25.000 hectares, tendo sido desenhado pelo Eng. Trigo de Morais, nos anos 60. É actualmente muito sub-aproveitado, apesar de continuar a ser um importante foco agrícola, onde se produz muito tomate, maioritariamente vendido fresco em Maputo.
Esta foi uma experiência interessantíssima para toda a equipa envolvida, e uma excelente oportunidade para aprofundar o conhecimento da região. Vimos agricultores que testaram técnicas novas, como estacar o tomate, porque tinham um campo onde tinham muito menos custos, e por isso podiam arriscar o custo de testar essa alteração. Mas vimos também agricultores que não estavam tão presentes porque tinham outras áreas agrícolas, que lhes exigiam tempo. Vimos que havia mecânicos na região, capazes de arranjar a mota do Salimo, que avariava bastante, mas que não teriam muita capacidade instalada para tratar de uma frota de tratores caso eles viessem a surgir na região para produzir tomate em larga escala. E vimos que os agricultores produziram melhor com rega por gravidade, tecnologia que dominavam, que com gota-a-gota, que era novidade. Mesmo com assistência técnica, as produtividades eram diferentes das previstas, o que era informação muito importante para o plano de negócios. Prestámos um verdadeiro serviço ao nosso cliente, que teve uma maneira prática de simular o negócio, ainda durante o processo de decisão, e ganhámos uma amizade e uma ligação especial àquela região.
Esta foi daquelas experiências que ficam para sempre na nossa memória!
Ficou provado que, em pouco tempo consegue-se pôr a produzir uma grande região com um enorme potencial desde que os investimentos sejam concebidos e implementados com qualidade, que fique garantido uma boa assistência técnica e que o produto final tenha uma colocação assegurada em condições vantajosas para os agricultores.
Miguel Vieira Lopes
COLABORADOR TÉCNICO
Manuel Medeiros
ÁREA INTERNACIONAL